O MODELO DE OCUPAÇÕES IRREGULARES NOS ANANCIAIS DE ÁGUA
A crônica abaixo, escrita em 2005, tem o propósito de ilustrar o modelo de ocupação em área pública e loteamentos irregulares, no caso, o denominado “Residencial Vilela”. Este “modelo”, com pequenas variações se repetem em dezenas de outros loteamentos em Parelheiros.
Loteamentos clandestinos irregulares: uma cronologia da impotência onde o direito nada permite e tudo pode ser feito e legitimado
No passado e com sabedoria, diante da perspectiva da escassez da água e crescimento da cidade, o poder público reservou a região de Parelheiros como área de mananciais e de proteção ambiental, para produzir água para a metrópole. Contudo, a crise do trabalho e a urbanização catastrófica e dispersa, sustentada em interesses econômicos imediatistas empurrou para a região de mananciais milhões de pessoas. No âmbito da Subprefeitura, que inclui os distritos de Parelheiros e Marsilac, último bastião das águas, seguindo a dinâmica citada, já se instalaram cerca de 200 mil pessoas. A região vem sendo ocupada aceleradamente e o adensamento refletido no censo, foi de 86% entre 1991 e 2000. Esta velocidade de ocupação tornou a região campeã dos menores índices de desenvolvimento humano as restrições e exigências legais para ocupação do solo provocou desvalorização imobiliária e, clandestinamente, se desenvolveu várias estratégias de invasão, ocupação e venda irregular. O cidadão desinformado ou acreditando que no Brasil sempre se da um jeitinho, seja pagando pedágio, pressionando politicamente ou pelo cansaço, vai conseguindo, mesmo em áreas invadidas, que se estenda o transporte, a luz, a água, telefone, educação, saúde, enfim todos os serviços públicos. Em resumo, o próprio poder público atendendo a este estilo de demanda, consolida a invasão e induz a novas ocupações. Para uns esta estratégia é negocio, meio de vida ou reprodução de poder político.
Recentemente, em uma área no citado “Residencial Vilela” aconteceu um desabamento que colocou em situação de risco várias casas construídas irregularmente. Nas situações de risco o poder público tem obrigação de retirar e oferecer abrigo de emergência ou algumas alternativas seguindo uma Portaria específica. Ao buscar as origens do loteamento se constata que é clandestino e que aquelas casas em situação de risco estão, além disso, em área pública e despejando o esgoto em córrego afluente do Caulim que leva água à Represa Guarapiranga.
Se constata que a simples repressão do poder público diminui o processo de ocupação, mas a morosidade do ritual burocrático-administrativo e judicial não interrompe a ocupação. Por ser irregular as construções seguem sem preocupação técnica, com movimentação de terra, infiltração de água servida e esgotos em barrancos e taludes provocando contaminação e criando as áreas de risco. O Estado fica só no “pronto socorro” do risco, intervindo nas conseqüências, com enormes custos político, psico-social e financeiro para retirar, abrigar, destinar e recompor o espaço deteriorado. São exemplos recentes o caso de Santa Terezinha e o Residencial Vilela.
No caso do “Condomínio Residencial Vilela”, o loteamento se iniciou em março de 1989, com o seguinte anúncio em jornal: “ESQUEÇA O ALUGUEL, J.B.S. Empreendimentos, Frente para a Av.Senador Teotônio Vilela, todos os melhoramentos e várias linhas de ônibus. Pequena entrada e saldo em 60 meses”. A então administração da Capela do Socorro aciona a fiscalização tentando paralisar a ocupação irregular com embargo em março de 1989. Em novembro, o PARSOLO 1, notifica SIMPRAMAR S/C LTDA. e seus representantes a suspenderem os recebimentos das prestações dos lotes. Ao mesmo tempo informa ao Ministério Público que os infratores eram os mesmos de outros loteamentos clandestinos (Lago El Dourado, Lago Azul e Recanto do Parque Cocaia). Os vendedores nem comprovaram serem os proprietários da área no Vilela, sem respeitar preservação de cursos de água, sem esgoto, sem água encanada, luz, guias, sarjetas, etc., venderam mais de 400 lotes que não podem ser regularizados por não cumprirem as regras de loteamentos em zona de mananciais.
Em janeiro de 1990, PARSOLO notifica novamente a empresa. Em 23 de maio denunciado o referido loteamento é feito ao, diretor do Departamento Estadual de Polícia do Consumidor-DECON. Nesta mesma data informa-se a RESOLO que o “referido loteamento foi implantado ainda este ano e sua ocupação é baixa, estando localizado em área de proteção de mananciais” e mais adiante, “...propomos, S.M.J. a remessa do presente processo a JUD para medidas judiciais cabíveis”. Em 19 de julho JUD12 faz seu relatório. Em 6 de setembro Resolo faz novo relatório do vôo 144, informando que o loteamento irregular em zona rural continua ampliando, já em 11 de novembro de 1990 constata a ocupação de 50% da área.
Em 4 de janeiro o diretor do JUD, em atenção ao relatório de 19 de julho deu um dá parecer. Finalmente em 26 de dezembro de 1991 o Ministério Público enuncia na 21a vara criminal os responsáveis pelo loteamento. Em 15 de abril os procuradores do JUD 12 propõem medida cautelar contra a SIPRAMAR: “.. exaurida sem êxito, a via administrativa, com intuito desfazer cessar irregularidade do parcelamento, somente resta à municipalidade socorrer-se do judiciário, com vistas a impedir que os requeridos prossigam com a prática de atos ilegais, levados a efeito em atual e iminentes prejuízo de terceiros... os adquirentes sofrerão real prejuízo pois, dificilmente poderão ter seus títulos reconhecidos e a coletividade ... suportar ônus de um empreendimentos executado em desacordo com os reais interesses do Município e da sociedade...agravando contaminação dos mananciais...” Em outubro os infratores entram com mandado de Segurança com pedido de Liminar a fim de dar efeito suspensivo e a Procuradoria faz defesa.
Em 9 de dezembro de 1992, vistoria do Resolo constata 70% de ocupação da área. Em 9 de Janeiro de 1995 a procuradora de JUD 12, declarou ter sido o loteamento considerado IRREVERSÍVEL. Em 5 de janeiro de 1995 foi feito o Acórdão de Apelação criminal 143.006-3/2-SP.(*).
Em 7 de março de 1996, um dos sócios do loteamento assinou um Termo de Compromisso de regularização em Resolo. Em 16 de setembro de 1998 Resolo G alerta a administração da Capela do Socorro, sobre o princípio de invasão da Rua 5, reservada pelo então parcelador clandestino para doação pública. O processo 1998-0.001-125-1 que trata da regularização do loteamento tramita até hoje no Resolo.
Em 25 de janeiro de 2005, em decorrência de fortes chuvas houve deslizamento de terra no final da Rua 3 com a Rua 5, sendo interditadas 42 moradias, sendo 21 em risco iminente de desabamento. A subprefeitura providencia um abrigo provisório nas imediações aplicando recursos próprios inicia processo de Cadastramento e desencadeia operação de remoção acompanhada pela SVMA e DUSM. A maioria se recusa a sair, convencidos a solicitarem indenização à Prefeitura. A Subprefeitura convoca lideranças do Bairro, explica o marco de decisões, entrega Portaria que disciplina encaminhamento de população em área de risco, faz folheto de esclarecimento à população e registra em Ata o teor dos entendimentos. Diante da contínua recusa em sair da área de risco e assinar termo de responsabilidade, a Subprefeitura registra Boletim de Ocorrência na Delegacia de Polícia e solicita ao jurídico que em coordenação com o DUSM, encaminhe processo de remoção judicial e processo de eventual apoio pecuniário a SEHAB.
Esta cronologia registra com fidelidade o modelo de legitimação dos empreendimentos clandestinos e irregulares na região. Isto confirmando o famoso jeitinho que no final tudo da certo, sem considerar os enormes custos. Imaginemos a quantidade de homens-horas, a mobilização de veículos e todos os recursos envolvidos nestes 16 anos.
Desdobramento do caso Residencial Vilela (cópia de ofício enviado a autoridades em novembro de 2008. o último morador sai em dezembro de 2008 e o loteamento esta para regularização)
Em cumprimento a V.Sria. vimos pelo presente encaminhar o que segue:
1- Em 25 de janeiro de 2005, em decorrência de fortes chuvas e da má condução de águas pluviais de escola próxima, houve deslizamento de terra no final da Rua 3 com a Rua 5, no denominado “Condomínio” Residencial Vilela. Um loteamento irregular com processo desde março de 1989. Ao assumir a gestão em 18 de fevereiro de 2005 encontramos esta situação em andamento. As ruas mencionadas foram comercializadas e ocupadas em área pública, em área de preservação permanente (APP) e com nascentes de córrego afluente do Rio Caulim. As moradias jogavam seus esgotos no citado córrego. Diante da emergência os técnicos da Subprefeitura interditaram 42 moradias, sendo 21 consideradas em risco de iminente desabamento. O deslizamento ameaçava inclusive o pátio de uma Escola (EMEI) construída no local. Na ocasião a Subprefeitura tinha adaptado um espaço como abrigo de emergência. Os afetados induzidos por lideranças rejeitaram sua utilização. Foi então iniciado um longo diálogo com os ocupantes da área. Na primeira ação de diálogo contamos com a presença do Secretário do Verde e do Meio Ambiente. As reuniões foram acompanhadas por lideranças políticas e de bairro da região apoiando os afetados.
2- Ao rejeitar o abrigo a Subprefeitura solicita ajuda emergencial para habitação e, em 2005, 12 famílias recebem R$ 5.000,00 (cinco mil reais) totalizando R$ 60.000,00 sessenta mil reais. Em 2007 43 famílias recebem mais R$ 215.000,00 (duzentos e quinze mil reais). Alem destes custos, operações e pessoal são acionadas para evitar a queda do pátio da Escola, sendo a Subprefeitura obrigada a reconstituir o talude, ao custo de milhares de reais. O cadastro das famílias foi encaminhado ao Departamento Patrimonial do Município e à justiça para a reintegração de posse da área. Em 2006 a Justiça ordena a reintegração. Para evitar um elevado custo social a Subprefeitura, em diálogo com os ocupantes, decide solicitar prazo ao juiz para buscar uma solução pacífica com a SEHAB.
3- Com informações da Assistência Social, considerando-se a área de risco a Prefeitura aceita conceder um auxílio às 49 famílias ocupantes. Finalmente, após ampla informação, tempo e apoio em transporte 42 famílias saem pacificamente. Devido a uma separação familiar, um dos membros recebeu e o outro voltou a ocupar exigindo também a ajuda. Os restantes afirmaram que não sairiam, a maioria destes de uma mesma família. Intentaram judicialmente suspender a ação, o que foi indeferido.
4- Em 12 de novembro de 2007, quase três anos depois, o Oficial de Justiça e o Departamento Patrimonial do Município solicitam à Subprefeitura suporte para a reintegração final à qual, juntamente com apoio policial, as equipes da Subprefeitura vão dar cumprimento à ordem judicial. Como foi feito desde 2005 volta a seré aberto o diálogo com os ocupantes. São feitas ligações para parentes colocados à disposição veículos para mudança e oferecido abrigo para crianças e adultos o que é rejeitado. Neste clima de desocupação, uma pessoa sorrateiramente se apossa da arma de um Policial Militar, o qual reage a tempo, entrando em luta corporal e com apoio de vários colegas imobiliza o agressor, evitando que destravasse a arma que poderia ter causado um desastre imprevisível aos servidores.
5-Em plena operação conflitiva surgem membros do Conselho Tutelar local e um membro do Conselho Tutelar que se identificou como sendo do Grajaú, acompanhados de uma Sra. que se denomina representante do Conselho Municipal de Habitação. Intercede também a Defensoria Pública. Diante deste quadro de pressão generalizada e a tensão da agressão armada inicial, o Oficial de Justiça por telefone se comunica com a Juíza que ordenara a desocupação e anuncia a suspensão da ordem judicial. Restaram 4 construções ocupadas e 3 desfeitas parcialmente, ainda com risco de desabamento. A Escola local corre risco devido à obstrução do canal de escoamento da água. Em nova audiência a Juíza determina que a Prefeitura instrua processo para a ajuda habitacional aos ocupantes.
6- Se feito um balanço do gasto público, sem considerar a ajuda habitacional e o desgaste psico-político e social, para preservar as nascentes e evitar mais risco à vida, incluindo custos para refazer a encosta e a mata ciliar, as horas-homens, horas-máquina e gastos administrativos, certamente se aproximam de 1 (um) milhão de reais. Além disso, fica um passivo psico-social muito significativo para todos os envolvidos. Como pode toda a situação gerar por um lado, o estímulo aos ocupantes por parte de instituições que deveriam zelar pelo bem comum e por outro, colocar o agente público encarregado de fazer cumprir a Lei como um algoz? Tal situação afeta a força moral e energia de trabalhar em favor do bem comum, pois aquele que viola as regras de convivência acaba ganhando estímulo e até recursos públicos.
7- Diante deste caso solicito orientações, resposta ou reflexões para as dúvidas de forma a dar uma resposta adequada aos servidores sob minha responsabilidade:
a) Qual o interesse coletivo e do bem comum em jogo neste caso: o dos ocupantes da área pública, adquirida ou não de forma fraudulenta ou de boa fé, ou o determinado pela Ordem Judicial?
b) Devemos deixar a moradia do ocupante construída em área pública, em nascentes, em área de preservação permanente e com tendência à adensar ou retirá-lo para garantir água que vai ao reservatório da cidade?
c) Quem arca com os custos de recomposição para garantir a estabilidade do prédio da Escola?
d) Qual a posição diante da ameaça de reocupação estimulada pelos apoios políticos recebidos?e) É legítimo que membros pagos por órgãos públicos, como Conselho Tutelar, Procuradoria, intervenham no momento de execução de uma Ordem Judicial de reintegração de posse de área pública como a em questão?
sábado, 31 de maio de 2008
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3 comentários:
por gentileza gostaria de saber., se a aréa CONDOMIO RESIDENCIAL VILELA., esta em processo de regularização., caso alguem saiba alguma informação.
segue meu email:
raul@despachanteleny.com.br
Parelheiros é um bairro maravilhoso e seu povo muito acolhedor.
Parabéns Walter, seu trabalho é exelente.
Condomínio Horizontal Residencial Vilela, Estrada de Parelheiros km 33 Processo Parte Fiscal nº 1989-0.012.828-0, processo RESOLO 1989-0.001.125-1, proprietário JBS Empreendimentos Imobiliarios Ltda A área pública foi desocupada por determinação Judicial. A SVMA vai recuperar a area com plantio de arvores. Processo foi indicado para regularização no programa 10 + 10.
Loteamento Estrada do Pinhal Recanto Campo Belo II, Processo Parte Fiscal nº 1991-0.026.699-0, Proprietário Arlindo Vieira de Andrade Processo RESOLO 1990-0.001.174-4,
Loteamento Av. Sadamu Inoue X Rua José Roschel Rodrigues - Recanto Campo Belo Processo Parte Fiscal nº 1999-0.201.551-4 e outros Proprietário; Celeste da Conceição Silva Martins Processo Resolo 2001-0.127.420-0 Processo de Parte Fiscal foi feito em nome do loteador Roberto Machado de Almeida . Trata-se das Oficinas Mecânicas prox UBS
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